segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

A cidade dos meus amores

Alto do Ipiranga
Nesta segunda "bebemora-se" o aniversário de uma das minhas paixões bandidas inveteradas: Sampa. Sempre brinco que precisamos ter olhos generosos para a beleza de suas entrelinhas. Paulistano está sempre correndo, então não capta essas sutilezas de como a cidade é uma graça. Mas é preciso ter olhos para ver. A maioria que reclama daqui passa oito horas no escritório (nos dias bons), mais duas de trânsito e trocentas dormindo pra se recuperar. Como captar nossos "presentinhos visuais" se rendendo a este cotidiano massacrante? Tem que ser  abduzido e doído assim? Talvez não. Alguns (não há como dizer se a maioria, pois a
Amanhecer no Terminal Sacomã
estatística sempre trabalha a favor de contabilidades "copo meio vazio") têm se reinventado, empreendido, frelado ou dado aulas em período menos hardcore. Não que eu seja um exemplo para o deleite dos respiros de Sampa não. Dei tanta aula, formação, contação, fiz tanto projeto e edição de livro fomentado ultimamente que estou enfrentando a terceira rasteira do corpo pedindo trégua. Por essas e tantas outras, acredito em educar o olhar. Dar pequenas paradas entre uma insanidade e outra, pra respirar, fotografar, escrever ou ver quem se gosta. E se fazemos isso menos do que deveríamos... Bem, a cidade segue aí dando seus rápidos
Catavento
presentinhos visuais entre um amanhecer e um entardecer, entre uma parceria e um trampo, entre uma visita e uma caminhada. Se não temos sensibilidade de aproveitar esses presentinhos fugazes... Como a culpa pode ser da cidade, se ela tem menos flexibilidade de por o pé no freio nos nossos abusos cosmopolitas que nós? Vai fazendo a contabilidade: quantas vezes fomos num dos parques urbanos e deitamos na grama até as formigas nos expulsarem? Ou o quanto seus pés sentiram a grama da praça perto do trabalho? Quantos caminhos novos você fez para
Centro Cultural da Juventude
recalibrar o olhar entre um corre e um e-mail? Quantas vezes mudou o lado que senta, escapuliu para lá da janela, trocou o metrô pelo ônibus em dias menos apertados? Então, a construção, o metrô, os bancos, a grama, as árvores, os grafites e os museus têm menos possibilidade de fazer isso que você. Faça e vá de encontro a eles.
Admito que São Paulo não é só "verde que violenta o asfalto", como diria primo Ignácio Loyola Brandão. É também a cidade da angústia: quando uma mostra cultural, histórica ou o raio que o parta resolve acontecer gratuitamente, é tudo em 48 horas, o azar é todo o seu que tem edital, planejamento, projeto ou semanário com prazo estourado para ser atualizado. Este feriado por exemplo, a dor é não poder ver Gilberto Gil pela
Igreja dos Pretos no Centro Histórico
enésima vez de graça no Clube Regatas Tietê, devido à minha temporada "Saci engessada".
Discordo do Criolo que Não Exista Amor em Essepê. De todas as vezes em que fiquei nervosíssima com serviço público deixando na mão, demissão, colega ou ficante sacaneando caprichadamente no meio da rua e chorei esquecendo que estava cercada da muvuca paulistana, sempre ouvi de desconhecidos se precisava de alguma coisa, se estava bem ou se podiam me ajudar. Minha colega das letras e colégios diria que a cidade tem essa vantagem do anonimato. Deus e o mundo do interior fala isso, mas sempre que abri o bocão, me constrangi quando ofereceram ajuda, resolvi "chorar na cama que era lugar quente", mas a cidade é tão grande que até chegar onde me escondo o mal estar já tinha passado,
Eu que venho da provinciolândia de "Sanca City"
Paulista com Angélica
acho encantadora a profusão das ideias, tribos e possibilidades. Já fui roqueira não praticante, regueira sem dread, gótica light só das letras ... Agora devo transitar entre a militante-educadora-artista-vegetariana-escritora lado B. A gente se senta pra beber com as outras turmas, discorda de 15 a 30 minutos, mas depois está todo mundo em casa, mesmo acreditando em batalhas diferentes, essa é a vantagem de estar em Sampa nos 30 e tantos anos.
Desnecessário reforçar que a cidade não é só parque-museu-boteco-natureza escondida-todos os cursos e mostras do mundo. Cruzá-la segue sendo uma chatura para os periféricos. Reconheço que melhorou com as faixas exclusivas, que preciso tomar vergonha na cara e aprender a andar de bike (nessas férias, o metatarso trincado não deixou), mas ainda tem esses bairros com duas opções de busão feito o meu, cujas demoras se resumem a escolher esperar além da paciência ou se deslocar mais até a civilização. No trânsito já fizemos de tudo mesmo: ler, fazer amigos, ensaiar, divulgar peça, brigar com defensor da queda da maioridade penal, reencontrar colegas, cumprimentar quem não lembramos quem é até agora, recordar os tempos de aborrescente...
A periferia duma cidade gigante oferece chances de solidariedade anônimas praticadas no quase silêncio da madruga. Como nas épocas em que pegava condução
Museu Lasar Segall
quatro e tanto, cinco da matina e os madrugadores já se reconheciam no ponto, brincavam e depois dum tempo de sumiço queriam saber onde tinham ido parar os colegas do amanhecer do sol a caminho do trampo. Meu sono nunca mais foi o mesmo depois dos 4 trabalhos iniciando nas madrugas, mas ainda assim cumprimentava os parceiros de ponto de ônibus rindo da minha desgraça:
- Um salve para quem caiu da cama!
E nestas temporadas desenvolvi minha teoria de que devíamos pedir na condução que todos fizéssemos uns vinte minutinhos de silêncio pelas horas de sono que todos madrugadores estavam perdendo. Acho que de tanto reverberar isso por aí, já cruzei com motoristas que apagam as luzes cedão ou tardíssimo nos busões.
Vila Buarque
Mesmo na única ocasião em que quis pedir pra lavar o chão da Fnac de Barcelona, trair Sampa e ficar lá de vez, reconheço que minhas raízes estão aqui, como dum baobá semi novo: aqui virei forrozeira temporariamente, caí de amores pela arte educação, consegui transitar do "jornalouquismo" pra dar aula, fazer projetos e contar histórias, amei e quis mandar dar um pau surra nos peguetes, fiquei doida de amor pela cultura afro, adotei um cachorrinho... É nessa profusão de possibilidades desvairadas da Pauliceia que me reinvento infinitamente. Nela ainda me repito nas postagens, como uma "jornalêra meio repetitiva" cobrindo a mesma pauta. Como Mário de Andrade, também me esparramaria pela cidade quando morrer, é onde está o coração teimoso, para onde voltamos feito lar de matrona acolhedora e rabugenta, ao mesmo tempo. Que esbraveja feito uma espanhola, faz comidinhas a lá italiana, tem a força da construção nordestina, mantem os traços japas por mais que a mistura esteja em cada esquina... É onde o corpo amolece quentinho chegando depois de horas insuportáveis de estrada, onde encontro tudo, levanto qualquer formação, estrategio ajudas e recalculo as rotas dos meus sonhos. Feliz "São Paulos", cidade de mil rostos.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Modelando uma arte educadora e contadora

Sempre procurei um trabalho significativo. Daí que não vi como ajudar quem mais precisava apurando, escrevendo, editando, pautando, cobrindo evento, divulgando, pesquisando, editando foto, acompanhando edição de vídeo... A médio prazo era mais uma peça numa indústria que atropela aqueles que usa, assim como me desenroscou quando não virei heavy user de redes sociais, atualmente ajustou "parafusos novos", mais em conta e super digitais. Sou dos textões, que os aficcionados em mídias sociais querem por no pelourinho e dar chibatas virtuais. Há pouco tempo até comecei a ver movimentos renovando esse pensamento estreito de que não querem ler ou ver entrevistas longas com o Fluxo, Ponte, A Pública, Mídia Ninja, Jornalistas Livres... Só que fui trilhando outras possibilidades de fazer algo significativo, que ajudasse as pessoas. Por um tempo imaginei que fosse pela yoga. Estudei, pratiquei, respirei, me alonguei, até paquerei entre um ásana e um pranayama, pois como dizia uma ex chefe amiga "era a única que ia pra um retiro e voltava apaixonada". É verdade que teve práticas em que me segurei pra não perguntar meio clichê:
- Você vem sempre meditar aqui?
Mas pelo meu vício de escrever para que os diretores e faxineiros entendessem, viciei em pragmatismo. Queria uma formação que traduzisse as posturas em "do cachorro olhando para cima, morto ou gato", indicasse as ideais para iniciantes, intermediários e avançados e que indicações (ou contra) tinham. Achava meio irreal focar no filosófico quando saíamos dos studios e caíamos na bolha do stress corporativo.
Depois tive a temporada certa de que seria a massagem, estudei, fiz retiro e rendi tests drive com retornos mais próximo do que sonhava entre amigas:
- Dormi bem depois da sua massagem!
- Saí de lá achando a felicidade possível!
Quando fiquei uma semana estudando, praticando massagem ayurvédica, meditando, comendo vegetarianamente, cismei que tinha que ter vindo da saúde ou ao menos da dança para ter aquele domínio de várias especificidades anatômicas nossas. Ranço que carreguei depois de abandonar o técnico em acupuntura nas primeiras aulas de cinesiologia ( cada fiapo do corpo tem 932983232 nomes). Ainda ouvi professora dizendo que como lembrava do metatarso (ossinho lateral do pé que quebrei nessas férias) meu argumento era infundado, mas... Também não foi nessa praia.
Paralelo a tudo isso sempre flertei, namorei e só agora casei de vez com as artes cênicas. Fazia uma comédia. Daí era raptada pelo trabalho. Atuava num drama. Fica sem grana e voltava à comunicação. Participava dum stand up. Os plantões me exauriam demais para continuar. Cantava num musical... Até que uma colega sugeriu que entrasse na Cooperativa de Teatro para conseguir bolsa e fazer licenciatura na Faculdade Paulista de Artes. Sempre conciliava oficinas de danças brasileiras, percussão corporal e..."contação" de histórias. Cismava que não conseguiria largar o osso do jornalismo, afinal já tinha 18 lá teimando que não era uma transição possível. Quando terminei a facu, minha mãe ficou doente, segurei o tranco, mas assim que ela melhorou eu caí. Da minha melhora em diante fui conciliando frelas e "contações", depois frelas e aulas no Estado, até dar aulas de biblioteca num "quartel de freiras" e finalmente artes na prefeitura. É no ABC, faço pequenas viagens, tenho me cansado mais que trabalhando na "Vila Cloaca Olímpia" em minha temporada de assessora, mas como me vejo mais ajudando o mundo a melhorar, foram surgindo formação, mais "contações", projetos, meu livro. E por ser apaixonada pela educação e arte, acumulei coisa demais, meu corpo vem apitando pra por o pé no freio, agora que ele gritou tenho fisicamente que desacelerar. Neste meio de caminho uma chefe deu um retorno duma palestra minha pra uma prima e isso circulou entre a parentada, que vinha dizendo:
- É, ensinar é plantar sementinhas, trabalho de formiguinha.
Só ultimamente vim entendendo, Quando "aluno" orientou a sala fazendo esculturas afro em papel tranquilizando os demais repetindo o que dizia:
- A gente não erra em arte, descobre caminho novo!
Com estudante perguntando num torpedo de feriado quando contaria história de novo.
Ou ouvindo pós adolescente querendo saber depois que bati a costela no metrô:
- Melhorou prô?
E num fim de semana entendendo a utilidade de estar num Whats Up da turma, recebendo trabalhos recriações deles do Van Gogh e incentivando, agradecendo remotamente.
Incentivando um adolescente que queria estudar tatuagem, depois da turma dele contrariar expectativas da gestão, devolvendo o ateliê inteiro, sem fugir pois ficava numa área aberta e voltando pra uma aula mais tradicional.
Rindo das alunas dizendo aos organizadores da semana da criança que eu é que devia contar histórias para elas.
Aprendendo com uma baiana significados de nomes indígenas numa música da Elis.
Fazendo teatro do oprimido com professor de projetos pelo fim da violência doméstica.
Detalhando e incentivando alunos nordestinos a produzirem seus cordeis.
Ouvindo professora para quem dei formação em literatura que acabará pedagogia e cursará a sonhada formação em artes. Sabendo que ela preparou os estudantinhos pra dançar carimbó.
Ouvindo estudante pedindo no almoço lá do "purgatório de freiras" para eu contar história ao irmãozinho na minha hora de folga fora da biblioteca.
Ou uma "expectadorinha" dizendo que tinha sido tão lindo o que fiz no palco intimista duma amiga em Sanca City e eu bancando a atriz para não chorar com os adultos pertinho.
Tendo ex aluna de um mês e meio no Estado me procurando pedindo revisão de poesia e dica para ela contar história numa festa. Esta última me fez um depoimento no meu aniversário que também fiquei limpando lágrima na padaria, dizia que dava performance, punha cachola pra funcionar...
Acho que a coroação nesse último ano e meio foi uma antiga estudante me chamando para assistir Coletivo Negro juntas.
Lógico que esse trabalho significativo (esse que vejo outros buscadores hoje caçando seus propósitos) não é conquistado com a maioria. Mas foi como uma tia ex bancária me ensinou: é trabalho de formiguinha, sementinhas plantadas, temos que comemorar os poucos brotos vingando.
Só acho que a primeira aluna amiga formação de plateia em processo a gente nunca esquece!
E no meio disso tudo, desnecessário falar que $ não é tudo. Afinal ela não acelerou a melhora da costela contundida, da operação do olho, do pé quebrado e nem me fará melhorar mais rápido da próxima cirurgia de vesícula.
Nestas áreas a gente só abraça o mundo pois melhorá-lo é urgente e acima de tudo, reverbera um retorno significativo e intangível!

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

De água turva

Bolhas de ar 
dão respiros
momentâneos
Espio árvores lá fora
subitamente
criei raízes
que latejam
Parte das plantas
de onde tateava
com naturalidade
ameaçam murchar
lembranças de outros azuis
longe daqui
os animais 
familiares
agora há pouco
assustam
como dragões
dum oceano cinza
Minhas barbatanas
ralam e sangram
Não reconheço mais
as cores desse fundo d´água
Era um oceano
metamorfoseado
num aquário 
claustrofóbico

Do nascimento de uma formadora

Estudamos muito no EJA lá de Santo André que o trabalho nos transforma (e nós a ele). Devo ter sentido isso de forma ligeiramente sutil com o jornalismo (porém tão light que não me lembro dum trampo específico pra comprovar com ele neste post). Educação não: é levar, sentir, atualizar e se resignificar toda a cada reencontro, pois lidamos com as pessoas em "estado bruto": curiosas, pé atrás, ansiosas, questionadoras...
A formação em literatura que dei durante o último ano pelo edital Impaes/ Cenpec foi assim me revirando, modelando, encantando... No meio do ano fui sentir que me alinhei bem à linguagem lúdica da criança e pra tudo falávamos numa brincadeira, mesmo que fosse pra pedir que não subissem todos juntos nas minhas pernas e colo. Mas engraçado que antes disso, na primeira Parada Pedagógica que dei, mostrando os pesos da literatura para adultos e crianças, já fiquei sem graça e feliz da diretora contar sobre outra formação em "contação" de histórias que foi com suas professoras:
- Ah, mas esperávamos uma formadora como essa aí, animada com o que ia contar, na outra foi muito teórico, nem deu muita vontade de rever a apostila que ganhamos...
Nas manhãs em que não ia aos mini grupos e só contava nos berçários, ia ganhando umas cobranças e "chuva de abraços coletivos" dos pequenos pelos corredores... Ainda bem que a professora de biodança me preparou na Faculdade Paulista de Artes: como ela gostaria desses balanços em seus começos ou fins de aulas de corpo...
A formação acontecia em serviço, ou seja, era contar uma história, "tourear" uma criança para que não mordesse a outra para tomar o livro, cantar um pouco, pedir ao outro que se desculpasse por empurrar o amigo, fazer roda, "fritar o peixe e vigiar o gato" para que dividissem meio forçosamente as obras.,, Além de
verificar com as professoras se tinham dúvidas, partilhar obras com elas, amarrar cadarços, conhecer os projetos delas, ajudar a servir almoço cedíssimo, lá pras "dez e meia da madrugada", fazer indicações, ajudar a dormir para ver se conseguíamos trocar mais um pouco do que vinham fazendo e que colaborações queriam, como ajudaria mais...
Rolaram também Paradas Pedagógicas com desenhista, musicista e pintor parceiros. O do interior fez com que várias criatividades um pouquinho tímida viessem à tona. O professor de desenho trabalhou do mais técnico nas creches ao mais subjetivo no Parque da Aclimação, onde os resultados foram cada vez mais líricos e gostosamente surpreendentes. A do canto trouxe todo um mundo sonoro, da escuta, do brincar, da arte perpassando o que fazíamos e estimulando nossos pequenos, além dos teóricos que nos nortearam. Isso sem contar a de projetos, que com as artes visuais, possibilitou aos estudantezinhos explorar seus sentidos e encantar-se com materiais diversos.
Mediamos ainda visitas ao Catavento, para um banho de ciências da forma mais didática possível e um reencontro com a natureza no Parque da Aclimação, onde a inspiração para o desenho também relembrou o quanto as árvores, folhas, flores, águas e animaizinhos deixam nossos "aluninhos" em estado de graça e como isso precisa ser proporcionado mais e mais vezes.
Ao final dos encontros semanais, após muitas histórias, desenhos, cantos, dança de roda, descoberta e encanto com materiais diversos, as professoras convidaram os pais para conferir o que cada turma criou em conjunto. Muita reciclagem, brincadeiras, instrumentos alternativos, encontro com as histórias, folclore, trabalho com as emoções... Tudo muito em grupo, parceiro, cocriado, estimulado
e valorizado. Havia um receio no ar de não ter muita ressonância com os pais, afinal a maioria trabalha e deve passar mais tempo fora da comunidade do que gostariam. Qual não foi nossa grata surpresa ao encontrá-los de peso, minha voz dando as boas vindas com um livro como objeto cênico, o medo da emoção não projetar a voz até os que ficaram mais no fundo... Depois muita circulação, encontro, experimento, animação com as crianças festejando cada brinquedo feito a muitas mãos, vários cliques, sorrisos o suficiente aqueceram o coração de que fomos no rumo certo. Mesmo quando as eventuais parcerias não promovem vitrines para "marqueteirar" o
elaborado ali na periferia. Mesmo sem arte educadores famosos pondo holofotes nas conquistas surtidas nestas creches públicas. Mesmo com uma mão na massa intuitiva encontrando aos pouquinhos os teóricos que a embasam,
Uma diretora de mãos dadas conosco nos apresentou como umas das parceiras que estimularam tanta cor, tanto som, tanta palavra, tanto conto, tanto desenho, tanta lenda, tanto aprendido a muitas, muitas mãos.
E o que se passou do ladinho de cá... Foi processo tão interno que nesta altura do campeonato compreendo melhor, a quase um mês do término. Tinha um trauma "brabo" com creche: quando pequena, ainda na minha fase grevista de fome, passei uma temporada numa em que não comia o que davam, mas também não podia levar o que comia, portanto lembro muiiiiiiito da fome e do quanto aquele "parquinho de diversões" parecia gigante e solitário enquanto todos os não grevistas comiam. Foi um avanço gastronômico eu não só almoçar nas creches em que elas eram
sempre tão acolhedoras, chamando para comer, mas também ajudar a servir e recolher o que os pequenos usavam, pois inexplicavelmente sempre tive aflição de comida amassadinha, só fui comer algumas frutas quando as segurei.
Outra estranheza da minha temporada beeeem pequena foi num escorregador ter batido com as minhas costas de encontro a uma pedra bem no finzinho de onde descíamos. A dor era qualquer coisa de tão forte, só lembro dumas professoras me segurando e eu sem
ar, não tinha como chorar. Desta vez aquele pátio cheio e todo o tempo do mundo até aquilo passar.
Apesar disso tinha um sonhozinho embotado de trabalhar com os menores, pois no fim das contas acabei 18 anos no jornalismo, com esta vontade em suspenso, para só depois mudar de vez e vir contar, dançar, folhear, destacar desenho, manusear objetos cênicos, explorar figurinos, pesquisar histórias, ensaiá-las, enviar matérias educativas, além de trocar e ajustar com cada professora como contribuir mais para aquela turma ter esse sentimento curioso com os livros, mesmo não letrando ainda. Lembro de vários folheando, recontando e de uma delas, a quem chamavam Sampaio, com chapeuzinho e cestinha, bancando a "cantriz" deste famoso conto de fadas.
Depois de meses juntos fui lembrando de antigas canções de infância, das rodas,
levando para sala, vendo que algumas professoras já tinham apresentado aquele repertório - este tatuado na gente, pelos corredores de onde brincávamos, desenhávamos ou manuseávamos massinha. Comecei contando e terminei cantando histórias - como dizia uma professora, as músicas são histórias cantadas. Dançamos roda e até o xote do contador de histórias! Ressuscitar isso pra mim foi trazer à tona o lado bom de minha antiga temporada na educação infantil e meio que reafirmar na prática para as colegas na formação o quanto tudo que carregávamos era válido ainda atualmente - como os pequenos se divertiam e engajavam com os brinquedos, histórias e músicas mais simples, menos imaginados que teriam aquela acolhida toda.
Creio que se voltar hoje à creche em que aprendi e "me perdi" ao mesmo tempo, já não doerão nem a barriga e nem as costas...!

segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Era difícil a vida antes do leave in

Este fim de semana tive que virar os álbuns de fotos do avesso pra que o namorido conferisse minha fase "quem me chamou"... Nem cantava Maria Betânia, mas meu cabelo era "todo essa artista". E antes que atirem o primeiro creme não enxaguável, quero deixar registrado nos autos pra posteridade: era difícil a vida antes dele. Não havia tutoriais, cabeleireiros especializados em madeixas afro ou blogueiros descolados. Lembro de usarmos abacate. Devíamos misturar com alguma coisa, só não recordo o que. Uma vez comi a outra metade da fruta e a casa toda rodou, foi o barato mais natural que já vivenciei. Como era época em que queria clarear os fios, vivia enchendo de chá de camomila e indo para o sol. Mas o crespo... Não tinha nada pra sermos razoáveis com ele. Leave in, técnicas específicas disseminadas para o dito cujo, vlogueiras antenadas ensinando mil macetes... Catzo nenhum! Tudo de que dispúnhamos eram familiares de cabelo liso que teimavam no pentear dos coitadinhos secos. Bom, daí o resultado não podia ser outro além duma tentativa braquela de Black Power. A bênção do pentear molhado com creme no chuveiro jamais circulou entre enroladas, cacheadas ou crespas. Creio que este esquema fui encontrando instintivamente, pois eram raros os que assumiam seus fios, descobriam como deixá-los razoáveis e divulgavam. Era tirar o nó dos coitadinhos e vê-los subir aos céus. Lembro duma vez em que minha mãe trouxe shampoo e condicionador para grandes volumes. Daí protestei, pois a dupla prometia subir cabelo de boneca, o meu já estava chegando às janela e porta dos vizinhos, pois era craque em arrepios laterais. Ela tinha entendido que a promessa do rótulo era diminuir os cabelos assim meio saidinhos como os meus. Nem posso reclamar muito, pois minha tentativa de acertá-los começou na adolescência, mas lembro da prima (que se divulgar imagens da época corta relações para sempre), vizinhas ou amiguinhas que praticamente "viraram japonesa" de tanto que os familiares esticavam os rabos de cavalo ou tranças para disfarçar as ondulações, leves ou caprichadas. Por isso digo que se atualmente o cabelo tem frizz é lucro, antigamente ele era "todo um frizz", de cima a baixo, da direita à esquerda. Lembro de ter estagiado na Credicard com uma secretária negra linda, que estava caçando um profissional focado em cabelo afro, pois não era mais possível pentear o cabelo da filha, tinha que por nas mãos dum especialista, será que ela alisou novinha daquele jeito? A coitadinha chorava horrores, não tinha condições da progenitora encarar sem se doer junto. Mãe e filha eram dois arrasa quarteirão, mas tudo, absolutamente tudo, anúncios, salões, cabeleireiros focavam em diminuir o volume do qual a maioria fugia. Milênios depois surgiram os leave in e foi possível sair do banho, empastar o cabelo de creme, amassá-los e finalmente deixar de sofrer com a profusão dos cachos desgovernados que tentei administrar por minha conta décadas. Descoberta semelhante a esta só a de fingir que meus dedos eram um pente, pegando meus nós desprevenidos entre o condicionador e o chuveiro e saindo com ares de quem nunca sofreu com este processo. Tudo seguindo o instinto, afinal quem dava a dica? A seco era certamente uma das torturas chinesas usadas pela ditadura, não é possível. Virando os álbuns fotográficos familiares pra ouvir as legendas sonoras criadas pelo namorido e rir no fim do domingo, imagino que cara de "até parece" faria se me contassem que num futuro não muito distante, seria viável ser crespa e feliz. Imaginaria que só na ficção. Tive liso na infância, então gostei quando mudou na adolescência, mas foi uma vida para nos entrosarmos até ouvirmos "elogiozinhos" aqui ou acolá. Tiramos sarro de todos os primos enrolados que tentaram deixar a juba crescer, coitados! E se soubessem que poderiam ser black power futuros e arrasar entre as hipster contemporâneas, teriam insistido? Há que se ter persistência com crespos: o cacho leva voltas e voltas, tempo e mais tempo para sair do visual vexatório de quem se atrevia a deixá-lo subir. O crescer dele era um trabalho oriental de paciência. E não éramos bons nisso adolescentes. Confesso que ainda não cheguei à suprema evolução com os cabelos que me sugeriu um cabeleireiro dos tempos de redação eletrônica, que recomenda aos enrolados não porem a mão nos fios por nada nesse mundo após lavar ou os tiraremos do prumo. Com esse calor? Misericórdia! Sou a primeira a mexer, prender, daí já era, dá uma detonada básica mesmo, fazer o que? Mas já comemoro sensíveis melhoras desde a aborrescência, ocasião em que como a Jout Jout, a torcida do Timão era minha amiga, mas ficar com alguém que é bom... Nem com reza! Adolescência é como TPM e plantão, louvado sejam Deus, elas passam! Depois podemos até rir de nossos antigos stresss. Prevendo isso na época duvidaríamos indiscutivelmente. E aquelas revistinhas de 5a categoria pro público sofredor da ocasião nem para investigar algo que aliviasse o espelho pros enrolados, crespos e cia. ltda...

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Diário de uma Semana sem Sutiã

O jornalismo é tão pouco inventivo
que falta de sutiã é manchete
Devo admitir que pesquei essa ideia de uma vlogueira famosa: escrever sobre sete dias de peitos livres! Nunca pensei que seria capaz de tanto! Quando a gente virou a peituda da sala na quinta ou sexta série, cisma que terá que contê-los até a eternidade. Afinal, nos ônibus eles balançam demais. Com cotoveladas eles doem. Na TPM, eles incham. Pois é, ao contrário das nossas ancestrais índias me via viciada nos dito cujos até o final dessa existência. Mas quem precisa da DeMillus, Valisere e cia quando está engessada na mãe, literalmente de pé para cima (meu amigo professor de história pensou que fosse uma figura de linguagem quando escrevi de Paraty que estava assim... Sabia de nada inocente!)
Lembro da minha amiga tradutora free lancer, que tem um pijama para trabalhar e outro para dormir: estou quase lá camarada! Será que ela também aboliu o sutiã? Até onde me lembro ela era tamanho 42 como eu...
Não foi uma libertação indolor, pois o ponta pé incial foi quebrar o metatarso... Mas quem se preocupa onde está o sutiã "que aguenta o tranco" quando o foco por dias e dias é encontrar uma posição que não doa, nem formigue ou incomode para ler, navegar e dar risada à toa? Hoje minha amiga quis saber se já estou passeando na rua. Quando pensei que já dominava as begalas, escorreguei na cozinha recém lavada. Fazer o que na vizinhança em que somos rodeados por "buracos nas calçadas", literalmente? Uma vantajona que tenho encontrado de ficar de molho é: sempre que me contam o quanto o sol está escaldante lá fora, eu apenas sinto muito franzindo as sobrancelhas. Estou perdendo todo o bronzeado que não adquiri enquanto estive na cidade histórica fluminense que tem praia. Mas quem se impota tendo sido a branquela azeda desde o pré escola? Já desconstruí essa "pira" de que ainda nessa vida tinha que voltar das férias morena jambo feito minhas amigas do movimento negro. Não sou branca demais, sou branca na medida. Qualquer incômodo visu alheio.
Mulher à frente de seu tempo
é a que sai balançando à luz do dia
pode fazer algum requerimento de devolução e troca ao departamento superior, mas ao que tudo indica estão ocupados demais para essas picuinhas de se importar com o
Como recomendava minha colega de trabalho, voltando à vaca fria... Cá estou eu, peituda e praticamente uma ativista dos Mamilos Livres. Ok, talvez nem tanto. Depende da camisola, eu admito. O bom é que sem a perspectiva de enfrentar a calçada que nunca ajudou nem a mobilidade das minhas malas de rodinha, que dirá das muletas, nem cogito conferir se está transparente ou não. Teve um vestido que herdei, pra não perder o costume, pois nessa família o escambo horizontal de roupas é muito ativo, me meti nele e nem parei no espelho pra verificar como caiu. Pendurada nas muletas não é lá muito cômodo ajustar roupinha de pé aqui e acolá. Ponho e entrego para Deus.
Caramba, como uma pessoa pode fugir tanto ao foco! Tem que ser blogueira, desencanar de ser "jornalêra", ó Senhor! Então, peitudas do meu Brasil varonil, se eu fosse vocês abolia o sutiã uma semana durante umas férias. Recomendo tanto a experiência que farei retiros na Serra da Mantiqueira pra queimarmos sutiãs com ferrinho embaixo do seio. Estes dias ouvi que o sutiã com bojo não serve aos peitos pequenos, sobra e começa a entrar roupa nele. Pois para gente que tem grande também é uó, já temos comissão de frente o bastante, daí colocamos esses malditos com ferrinho e enchimento e pronto, nunca mais conseguimos retomar contato visual com nenhum homem, pois como já revelou uma sabedoria de sitcom, vivemos em uma sociedade mamocêntrica. Fora que embaixo da roupa, desconfio que ele deixe alguns decotes tão à vontade em cima que tudo que vamos comer, dividimos com o meio do peito. Sutiã na gaveta é tão libertador!
Admito que no busão é inviabilizador pegar trajetórias periféricas, nas quais de acordo com minha mana quase sueca favorita, temos que fazer base com os braços embaixo pros pobrezinhos dentro dos "pula pula". Contra TPM e encontrões de cotovelos... Desconfio que só o top para exercício mesmo. Acho que tive quase uma revelação após tantas rendas e nylon. Mas só testo quando voltar à ativa. Enquanto isso, ahpaporra sutiã!!

quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Querido Pé

Espero que esteja curtindo seu repouso mais que eu, aliado! Sim, já nos metemos em tantas gravações informais de Lost, vivências expressas de Survivor e exploração bandeirante em meio à chuva e às formigas famintas, que não entendi como foi me deixar na mão bem numa trilha tão "mamão com açúcar" em Paraty. Sim, admito que nem as pedras irregulares ou minha pisada torta colaboram, mas veja bem, na viagem anterior para lá praticamos a insanidade de conhecer esta cidade histórica praiana com pífios dois dias de folga e você se safou dos malditos paralelepípedos históricos. Foi só voltar com mais tempo, depois de séculos querendo pular onda na virada e você me faz mudar de ano presa à beira da piscina, "pulando água com cloro da garrafa do namorido". Seria cômico se não fosse patético. Mas não puxarei sua orelha, até pela sua natureza anatômica não possui uma, mas reforço que sinto muito pela conjunção astral da overdose de teimosia sagitariana na virada. Não, não tínhamos o tênis que não causa bolha, então cismei que podia ouvir conselhos caiçaras que nascem no mar e morre na cachoeira e ir de chinelo. Eu sinto muito por forçar amizade agachando para escapar às plantas com espinhos e deixando o joelho fragilizado para saltar ansiosa do jipe mais tarde e esbagaçar o metatarso. Obrigada pela "revisão de anatonia on progress", havia anos que tinha te estudado na yoga, na massagem, não precisava ser tão incisivo na lembrança de que já tinha te apagado das memórias táteis. Foi de uma "inocência bem síndrome de Peter Pan zodiacal" mesmo, acreditar que sem condicionamento sairia impune de subir, descer, me enfiar n´água, cruzar rios e sair sem nenhum estrago só no chinelinho cheio de flores e brilhos da minha mãe. Bem que já tinha me sentido uma "Barbie de salto na floresta" quando desci de Paralheiros até a praia com a campeã em travessias ousadas Camis, mas desta vez, admito que me superei. Sim pé, onde já se viu bancar tanto a principiante num único dia e como se todas as surrealices acima não bastassem, também não alongar? Admito que demandei demais do anjo da guarda na virada. Foi demais até pra ele, que sempre cabeceia para fora da grande área. E já que havia deitado e rolado o dia todo, como não respirei um bocadinho mais e esperei o jipeiro me tirar daquele diabo de carro alto e fui arriscar salto iniciante naquela altura do campeonato? Eu sei, nem posso reclamar contigo, creditar a um pezinho inocente todas as aventurazinhas que enfiei nas entrelinhas desta trilha, visita ao quilombo e experimentação gastronômica, Puxa, mas você se lembra daquela cachoeira gigante, parecia as de Paranapiacaba? De fato, havia pedido a Iansã, Oxum ou Erê que carregassem o que não servia naquela piscininha de hidromassagem à beira dela. Povo exagerado esses orixás, custava carregar sem tanta violência? Como diria uma colega da Metô, o povo é bruto! E aqueles pastel de jaca verde e suco de juçara? Os "parça" vegano de Sampa amariam. E naquela praia "podicrê" pra caramba, em que o casal coxinha que foi comigo resolvia por reparo em toda tatuagem, dread e afins do caminho? Como eles não viam que destoavam do habitat ripongo de Cambury? Mas o melhor mesmo era o guia chiar o quanto estava cheio e nós o consolarmos "cara tu não sabe o que é praia cheia, fim de ano na nossa terra é um mar de guarda sol". Agora, cá entre nós, que o inferno das 14 horas de estrada na van ouvindo filme violento já passou, vamos resgatar os ásanas yogues de equilíbrio e parar de socar o gesso no chão? Já foram três em uma semana, já deu. Também não consigo dormir de barriga para cima, então vamos encontrar um "quase bruços" razoável para passarmos a noite sim? E para que tanta caídas das almofadas nestes cochilos  sem fim da quase falta do que fazer? Já fui fanfarrona tudo que podia ultimamente, não sobrou cota nenhuma para você bancar o engraçadinho. Obrigada por ainda não coçar, mas pode suspender também esse formigamento sem noção aí. Sinto muito, ainda não achei nada que não doesse as costas, incomodasse a bunda ou formigasse você. Vamos colaborar para ler, ver filmes ou tentar bancar a empreendedora cultural nas férias, já que as viagens e oficina clown foram para o brejo mesmo? Gradecida. Sei que foi um guerreirão dando perdido nas minhas aventuras, viradas, torcidas e abusadas em quase quarenta anos. Vamos colaborar que faltam só 23 dias. O que são umas semaninhas aí pra quem já encarou tanta calçada no buraco neste Brasilzão de meu Deus? "Tirinho de espingarda", né não? Agora segura na mão de qualquer familiar, amigo, vizinho, namorado ou tio disponível e vai, que nossas pisadas laterais são pouco confiáveis. Prometo achar alguma corrigida mezzo zen pra nos por no prumo que os "over energia" já me deixaram com os ovários cheios. Vamos "fingir demência" pra não distrair minha "superatividade criativa" do que restou nestas quase férias? Valeu. Falou.